Medicina Nuclear, fitoterapia e interacções farmacológicas

Algo que nos deveria fazer pensar (a nós adeptos das medicinas complementares e, em particular, aos praticantes de Medicina Chinesa) é o contraste existente entre as nossas exigências de reconhecimento, de liberdade de prática, de autonomia profissional e as nossas afirmações completamente disparatadas.

Todos desejamos ser incorporados no Sistema Nacional de Saúde. Todos desejamos ver a nossa profissão regulamentada e os nossos cursos reconhecidos, assim como a nossa capacidade de, responsavelmente, tratar um doente. No entanto, comportamo-nos como se a nossa prática em nada influenciasse as práticas de outras profissões de saúde como a Medicina Ocidental. Deixem-me dar exemplos, alguns deles, bem reais.

Estudos de medicina nuclear que podem ser afetados pela fitoterapia

Existem alguns estudos de Medicina Nuclear onde é necessário fazer marcação in vitro ou in vivo de eritrócitos. Para se fazer a marcação destes consituintes com tecnécio é preciso reduzir o tecnécio (costuma usar-se cloreto estanhoso) e sabe-se que existem imensos produtos naturais com grandes ou pequenas quantidades de anti-oxidantes que podem alterar a redução do tecnécio (redução significa receber electrões e oxidação perder electrões. É possível reduzir o tecnécio com doadores de electrões como o cloreto estanhoso. Existem produtos naturais que são doadores de electrões e outros que não)[i] o que significa que algumas das fórmulas que usamos poderão conter plantas que podem prejudicar ou beneficiar estes exames de Medicina Nuclear.

Deveríamos tomar isto em consideração? Ou deveríamos esquecer estes pequenos factos e deixarmo-nos conquistar pela bela e infantil ideia, que as nossas fórmulas tratam o paciente a nível energético e não interagem com os químicos? Se desejamos realmente ser levados a sério pelas diferentes profissões de saúde, então é altura de começarmos a ter discursos mais sérios.

A vantagem em ter uma licenciatura em Medicina Nuclear é que acabo por possuir um extenso baú de exemplos. Permitam-me dar outro exemplo, desta feita, relativamente a doentes cardíacos.

Cardiologia em Medicina Nuclear

Cada vez mais se usa um exame de Medicina Nuclear chamado Cintigrafia de Perfusão do Miocárdio. Tem imensas funções, desde localizar lesões cardíacas, ver extensão das lesões cardíacas, estudar viabilidade após enfarte do miocárdio, diferenciar isquémia de cicatriz (avaliação da viabilidade do miocárdio), etc…

É comum dividirem-se estes estudos de perfusão do miocárdio em 2 partes. Uma parte onde é avaliada a função cardíaca em repouso e outra em esforço. Também é comum, em muitos pacientes, fazer-se esforço farmacológico, onde se usam determinados químicos como a adenosina o dipiridamol ou a dobutamina.

Nestes estudos, o paciente é aconselhado a não tomar café ou chás devido à presença de xantinas que poderão afectar os estudos com esforço farmacológico. A adenosina e o dipiridamol são vasodilatadores enquanto a dobutamina é um agente simpaticomimético.

Muitas das vezes a nossa fitoterapia é prescrita em comprimidos ou gotas e não em chás. Nós deveríamos levar estes factos em linha de conta na medida que o paciente não associa os suplementos alimentares a chás e poderá continuar a tomar uma fórmula que irá potencializar ou inibir os efeitos dos agentes vasodilatadores (adenosina e dipiridamol) ou dos agentes simpaticomiméticos (dobutamina).

Neste caso em particular mesmo que não advenha nenhum mal directo para o paciente o exame pode ficar enviabilizado. Não tratamos e fazemos com que o paciente seja sujeito a doses de radiação desnecessárias porque o exame poderá ter de ser repetido.

Conclusão sobre fitoterapia e medicina nuclear

Muitos leitores poderão achar que sou demasiado alarmista. Afinal de contas não está descrito nenhum caso de pacientes cardíacos em que os tratamentos de fitoterapia se tenham incompatibilizado com os estudos de perfusão do miocárdio. No entanto existem uma série de outros casos em que está bem descrita a incompatibilidade entre os tratamentos de fitoterapia e medicação ocidental.

Por outro lado se desejamos realmente ser inseridos no Sistema Nacional de Saúde temos de levar em linha de conta que a probabilidade de tratar esse tipo de pacientes será maior e, consequentemente, maior será o risco de surgirem casos reais. Uma questão que se poderia levantar seria: que formação temos nós para trabalhar integrados em equipas de saúde. Mas esta questão eu deixo para outro artigo. Para já só gostaria de saber se o leitor ainda acha que os tratamentos energéticos não se incompatibilizam com os tratamentos químicos?

NOTAS FINAIS


[i] Outros fenómenos como a alteração da morfologia dos eritrócitos também está estudado com provas de que a toma de determinados produtos naturais tem real capacidade de promover alterações a nível morfológico dos eritrócitos. Uma fonte acessível será o link: http://biblioteca.universia.net/ficha.do?id=37355220.